Assembléias de Condomínio
por André Luiz Junqueira.
por André Luiz Junqueira.
RESUMO: Este trabalho se propõe a esclarecer quais seriam as principais
medidas para se evitar a anulação de assembléias de condomínio e,
paralelamente, empreendendo uma análise da legislação aplicável.
SUMÁRIO: 1. Introdução. – 2. Convocação. – 3. Quorum. – 4. Direito de defesa em
assembléia e participação do inadimplente. – 5. Conclusão. – 6. Referências
bibliográficas.
1. INTRODUÇÃO
O tema proposto para
este trabalho, Assembléia Geral (AG), ordinária (AGO) e extraordinária (AGE),
integra profundamente a vida em condomínio. E, mediante análise do texto legal,
buscaremos explicitar algumas cautelas que devem ser observadas para que o
condomínio não seja surpreendido com algum pedido de anulação de AG.
O presente trabalho
não visa esgotar todo o tema, por esse motivo, não exploramos todas as posições
doutrinárias e jurisprudenciais existentes.
2. CONVOCAÇÃO.
Devemos ter em mente
que a convocação tem o intuito de dar ciência a todos os membros de uma
comunidade que determinada matéria será debatida. Nesse contexto, deve-se ter
dois cuidados principais: (1) todos os condôminos devem ser convocados; e (2)
definir no edital de convocação quais os assuntos que serão debatidos.
Sobre a convocação de
todos os condôminos, existe previsão expressa em lei, é o Artigo 1.354 do
Código Civil Brasileiro, que diz: “a assembléia não poderá deliberar se todos
os condôminos não forem convocados para a reunião”. A Lei Federal nº 4.591 não
previa essa obrigatoriedade. Mas regras comportam exceções, como o julgado
abaixo do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro:
“AÇÃO ANULATÓRIA. PROCEDIMENTO SUMÁRIO. ASSEMBLÉIA GERAL ORDINÁRIA.
CONDOMÍNIO HORIZONTAL. IRREGULARIDADES NA CONVOCAÇÃO DOS CONDÔMINOS. PRETENSÃO
DE OBTER ANULAÇÃO DA ASSEMBLÉIA A FIM DE AFASTAR AS DELIBERAÇÕES NELA TOMADAS.
Algumas exigências formais de convocação para assembléias condominiais não são
levadas em conta quando não há prejuízo para os condôminos em geral. Ao que se
vê dos documentos anexados o quorum foi válido e alcançara todos os objetivos.
A falta de convocação de oito condôminos não é suficiente para anular o ato, já
que o condomínio possui 288 unidades, sendo correta a convocação por documento
colocado na caixa de correio de cada apartamento. Sem dano não há nulidade.
Inexistência de dano. Correta a decisão monocrática de improcedência que ora se
mantém. Desprovimento do apelo.” (TJ/RJ, 10ª Câmara Cível, Apelação Cível
2006.001.12551, rel. Des. WANY COUTO, j. 07/03/2007)
Embora a lei não
determine a forma de convocação, é aconselhável que a convocação seja feita por
escrito e que seja colhida alguma prova de seu recebimento, embora o Art. 1.334
III do Código Civil dê liberdade para que a convenção determine tais condições.
Dependendo da previsão da convenção, até mesmo cartas simples podem ser
utilizadas para a convocação, como já foi decidido pelo Superior Tribunal de
Justiça no julgamento do Recurso Especial nº 801.295/SP, cujo relator foi o
Ministro Castro Filho:
“RECURSO ESPECIAL. CONDOMÍNIO HABITADO. ASSEMBLÉIA GERAL. CONVOCAÇÃO.
CARTA SIMPLES. VALIDADE.
I - A exigência de carta registrada ou protocolar para convocação da
assembléia geral do condomínio, nos termos do artigo 49, § 2º, da Lei nº
4.591/64, diz respeito tão-somente ao período em que o edifício está em
construção.
II - Validade da assembléia convocada por carta simples, em condomínio
habitado.
Recurso não conhecido, com ressalva quanto à terminologia.”
A lei também não
impõe nenhum prazo mínimo para a convocação, deixando à livre disposição da
convenção do condomínio. Mas, para deliberações em geral, sem urgência, mesmo
que a convenção permita um prazo menor, orientamos que a convocação seja
promovida com, pelo menos, dez dias de antecedência, pois na prática de gestão
condominial, esse prazo tem se mostrado mais adequado para a publicidade da AG.
A assembléia geral
ordinária pode ser convocada pelo síndico ou por ¼ dos condôminos ou mediante
requerimento judicial de qualquer condômino. Assim prevê o Artigo 1.350:
“Art. 1.350. Convocará o síndico, anualmente, reunião da assembléia dos
condôminos, na forma prevista na convenção, a fim de aprovar o orçamento das
despesas, as contribuições dos condôminos e a prestação de contas, e
eventualmente eleger-lhe o substituto e alterar o regimento interno.
§ 1o Se o síndico não convocar a assembléia, um
quarto dos condôminos poderá fazê-lo.
§ 2o Se a assembléia não se reunir, o juiz
decidirá, a requerimento de qualquer condômino”.
Por outra banda, a
assembléia geral extraordinária pode ser convocada pelo síndico ou por ¼ dos
condôminos, conforme o Artigo 1.355 do Código Civil. Mas, como será visto em
capítulo posterior, sugerimos que o condomínio permita a convocação por
condômino que deseje recorrer de alguma penalidade aplicada. Essa convocação
era prevista no § 3º do Art. 22 da Lei nº 4.591: “a Convenção poderá estipular
que dos atos do síndico caiba recurso para a assembléia, convocada pelo
interessado”. A adoção desse dispositivo, mesmo que facultativa, é altamente
recomendável, pois será vista com bons olhos frente eventual questionamento
judicial do direito de defesa de um condômino ou ocupante.
Ainda sobre quem pode
convocar uma AGE, na hipótese de obras ou reparos necessários que gerem
despesas excessivas, o Art. 1.341, § 3º permite a convocação de AGE por
qualquer condômino.
O segundo item
indicado no início deste capítulo diz respeito a definir no instrumento de
convocação quais os assuntos que serão debatidos. Tanto o Código Civil quanto à
antiga lei de condomínios não dedicam muito espaço em seus textos para esse
detalhe, porém, é de grande importância que os assuntos a serem debatidos sejam
conhecidos pelos condôminos de antemão. É importante que conste como item de
pauta qualquer matéria que (a) implique em aumento de despesas (tais como obras
ou fixação de quota), (b) afete direitos dos condôminos (deliberação de multa,
destituições, sorteio de vagas de garagem, criação de normas, etc.) ou (c)
possua quorum definido pela lei.
É freqüente a
anulação de assembléias que deliberam sobre assuntos importantes, mas cuja
pauta consta apenas a expressão “assuntos gerais”. Como ensina Marco Aurélio
Bezerra de Melo (MELO, 2007, página 267):
“Dentro do possível, deve ser evitada a expressão vaga e imprecisa
‘assuntos gerais’, pois o condômino tem o direito de saber adredemente quais
serão os temas versados na assembléia, até mesmo para que decida sobre o seu
comparecimento”.
O único item que
permite a discussão de vários assuntos de interesse do condomínio, seja ele
envolvendo despesas ou normas que restrinjam direitos, é, ao nosso ver, o item
“aprovação/alteração de convenção”.
3. QUORUM.
Quorum é o número
mínimo de votos exigido por lei ou convenção para a aprovação de determinado assunto.
Matérias como alteração de convenção, alguns tipos de obras, construção de novo
pavimento, alteração de destinação, destituição do síndico, dentre outras, têm
quorum fixado pela Lei.
Embora opinemos pela
prevalência do quorum legal perante um quorum convencionado, caso a convenção
estipule quorum diferente do da Lei, orientamos que o condomínio, se possível,
aprove com o quorum mais rígido possível, para evitar que a decisão do
condomínio fique à mercê da interpretação do Juiz sobre o quorum aplicável ao
caso.
Todos os votos em
assembléia devem ser proporcionais às frações ideais, salvo estipulação em
contrário na convenção (Art. 1.352 Parágrafo único do Código Civil Brasileiro).
Também é importante
que diferenciemos os termos “maioria simples” e “maioria absoluta”:
“... analisemos o significado da expressão “maioria absoluta”. Maioria
absoluta representa mais da metade de todos os votos do condomínio. Por outro
lado, maioria simples consiste em mais da metade dos votos dos condôminos
presentes à assembléia. As expressões não são sinônimas, o legislador sempre
busca expressar uma idéia sem o emprego de sinonímia, essa é a regra expressa
no Art. 11, II, “b” da Lei Complementar Federal n° 95.” (JUNQUEIRA, 2007).
Quando possível,
também sugerimos que se inclua no edital de convocação o quorum respectivo de
deliberação de cada item de pauta, essa medida permite que os condôminos tenham
noção de que as suas ausências impedirão a aprovação de uma matéria relevante.
A seguir,
relacionamos as matérias que possuem forma de aprovação fixada pela Lei
(assunto, fundamentação legal e quorum, respectivamente).
1.
Aplicação de multa de até 5 quotas por
descumprimento de deveres condominiais – Art. 1.336 § 2° do CCB – 2/3 dos votos
(OBS¹: essa multa não pode ser aplicada se o dever descumprido é o do pagamento
de quotas; OBS²: essa multa pode ser aplicada mesmo se não houver previsão na
convenção);
2.
Aplicação de multa de até 5 quotas por
descumprimento reiterado de deveres condominiais – Art. 1.337 caput do CCB – ¾ dos votos (OBS¹:
essa deliberação só pode ocorrer se a convenção estipular o critério de
reiteração, uma vez que o Código não o faz);
3.
Aplicação de multa de 10 quotas por
descumprimento reiterado de deveres condominiais e que gere incompatibilidade
de convivência com os demais – Art. 1.337 Parágrafo único do CCB – ¾ dos votos
(OBS¹: essa deliberação só pode ocorrer se a convenção estipular o critério de
reiteração, uma vez que o Código não o faz; OBS²: o valor de 10 quotas não pode
ser diminuído, afinal, se a assembléia reduzir o valor, ao nosso ver, fica
claro que a conduta não era tão insuportável a ponto de causar
incompatibilidade de convivência);
Como mencionado, as
multas por reiterado descumprimento de 5 e 10 quotas não são aplicáveis sem
previsão expressa da convenção. Isso se deve não só pela falta de definição da
reiteração (número de transgressões em determinado período de tempo), mas,
principalmente pela obrigação legal da convenção prever todas as sanções a que
os condôminos estão sujeitos, por força do Artigo 1.334 IV do Código. Em outras
palavras, se a convenção não prevê a penalidade não pode ser aplicada. Com
exceção da multa prevista no Art. 1.336 § 2°, onde o legislador teve o cuidado
de permitir a sua aplicação, ainda que a convenção fosse omissa.
Outro detalhe
importante é o termo “anti-social”. Anti-social significa o que é contrário a
sociedade. Quando associado a uma pessoa, anti-social seria aquela que
transgride as normas de determinado lugar ou tempo, portanto, ao inserirmos
esse significado em matéria de condomínio edilício, obtemos o seguinte
conceito: conduta anti-social é toda aquela que transgride as normas internas
do condomínio criadas pela Convenção, Regimento Interno ou Assembléia. Toda
conduta anti-social é punível, mas somente a que for reiterada e gerar
incompatibilidade de convivência é que será punível pela multa de 10 quotas
prevista no Parágrafo único do Art. 1.337. Por isso destacamos a necessidade de
tratamento adequado do assunto na convenção do condomínio.
4.
Realização de obras voluptuárias – Art.
1.341 I c/c Art. 96 § 1° do CCB – 2/3 dos votos (OBS¹: o Código Civil expressa
que: “são voluptuárias as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso
habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor”;
OBS²: exemplos desses tipos de obras seriam as construções de uma quadra
esportiva ou de uma piscina);
5.
Realização de obras úteis – Art. 1.341
II c/c Art. 96 § 2° do CCB - maioria absoluta (OBS¹: o Código Civil expressa
que: “são úteis as que aumentam ou facilitam o uso do bem” ; OBS²: um exemplo
dessa obra seria a instalação de um portão de garagem eletrônico no lugar de um
mecânico);
6.
Realização de obras necessárias e que
importem em despesas excessivas – Art. 1.341 § 3° c/c Art. 96 § 3° do CCB –
maioria simples em 2ª convocação (OBS¹: o Código Civil não fixa quorum algum
para esta deliberação, o que nos remete à regra geral do Art. 1.352 e 1.353;
OBS²: em nossa opinião, a convenção não pode fixar um quorum mais rígido para
essa votação, devido à essencialidade da obra; OBS³: o Código Civil expressa
que: “são necessárias as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se
deteriore”; OBS4: por exemplo, seriam obras necessárias as de
reforma de fachada ou telhado que ameace ruína);
7.
Realização de obras de acréscimo em
partes comuns – Art. 1.342 do CCB – 2/3 dos votos (OBS¹: a ampliação da área da
garagem seria um exemplo desse tipo de obra);
É importante deixar
claro que a classificação de uma obra como necessária, útil, voluptuária ou de
acréscimo tem espaço para inúmeras interpretações. Deve-se sempre analisar o
caso concreto antes de se tirar conclusões definitivas quanto à natureza da
obra.
Selecionamos alguns
julgados do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro que demonstram a
dificuldade na classificação das obras:
“CONDOMÍNIO - COBRANÇA DE COTAS EXTRAORDINÁRIAS - ELEVADORES COM MAIS DE
CINQUENTA ANOS DE USO REFORMA - OBRA ÚTIL E NECESSÁRIA - APROVAÇÃO POR MAIORIA
DOS CONDÔMINOS (Artigo 1.341, II, do Código Civil vigente).A reforma de
elevadores com mais de 50 (cinqüenta) anos de uso não pode ser considerada
voluptuária e sua aprovação por maioria em Assembléia Geral obriga a todos
condôminos no pagamento das respectivas cotas extraordinárias. Recurso
improvido”. (TJ/RJ, 7ª Câmara Cível, Apelação Cível 2007.001.38066, rel. Des.
JOSE GERALDO ANTONIO, j. 25/07/2007)
“CIVIL. SUMÁRIA. CONDOMÍNIO EDILÍCIO. DELIBERAÇÃO ASSEMBLEAR.
DECLARATÓRIA DE NULIDADE. Deliberação de AGE que acatou parecer jurídico e
concluiu pela natureza voluptuária de obra de aquecimento de piscina,
considerando prejudicado o tema da ordem do dia pelo não comparecimento da
totalidade dos condôminos. Rejeição da obra em AGE posterior, por maioria
absoluta de votos. Pretensão de condômino em anular a deliberação, por entender
que a obra é útil e não voluptuária, com pleito de que seja declarada,
incidentalmente, essa natureza jurídica. Deliberação soberana sem qualquer
vicio, impossibilidade de sua modificação pelo órgão de justiça, sentença de
improcedência incensurável, improvimento ao recurso que pretendia revertê-Ia.
Unânime”. (TJ/RJ, 3ª Câmara Cível, Apelação Cível 2005.001.18518, rel. Des. MURILO
ANDRADE DE CARVALHO, j. 17/01/2006)
“CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. CONDOMÍNIO. COTAS EXTRAS. OBRAS ÚTEIS E
NECESSÁRIAS, APROVADAS EM AGE, POSTERIORMENTE À SUA REALIZAÇÃO, POR MAIORIA DE
VOTOS. INEXISTÊNCIA DE IRREGULARIDADE. A alegação de que teriam sido voluptuárias
depende de prova pericial, não produzida. Interpretação dos artigos 1.315,
1.341 e parágrafos do Código Civil. O condômino responde pelos encargos
aprovados em assembléia, ainda que ausente ou tenha sido vencido na votação.
Sentença correta. Apelação improvida”. (TJ/RJ, 7ª Câmara Cível, Apelação Cível
2005.001.17010, rel. Des. CARLOS C. LAVIGNE DE LEMOS, j. 16/11/2005)
8.
Aprovação da convenção do condomínio –
Art. 1.333 caput do CCB
– 2/3 dos votos, obrigatoriamente proporcionais às frações ideais (OBS¹: essa é
a forma de aprovação da primeira convenção do condomínio, por isso os votos
deverão ser proporcionais às frações ideais, conforme o Parágrafo único do Art.
1.352);
9.
Alteração da convenção do condomínio –
Art. 1.351 1ª parte do CCB – 2/3 dos votos;
A alteração da forma
de rateio das despesas do condomínio também deve respeitar esse quorum, uma vez
que cabe à convenção determinar a forma de contribuição para as despesas do
condomínio (Art. 1.334, I do Código Civil). No Tribunal de Justiça do Rio de
Janeiro, o acórdão a seguir adotou a mesma interpretação:
“ACÃO DE COBRANÇA. COTAS DE RATEIO DE DESPESAS CONDOMINIAIS. AUSÊNCIA DE
QUORUM DE 2/3 EM ASSEMBLÉIA PARA ALTERAÇÃO DE CONVENÇÃO. NULIDADE. Ao contrário
do que alega o Condomínio, a decisão tomada para o rateio das despesas do
orçamento anual vai contra o que determina a Convenção, configurando alteração,
sendo assim o quorum da Assembléia para alteração de Convenção foi
desrespeitado, ensejando nulidade, pois não alcançou dois terços dos condôminos.Sentença
que se mantém”. (TJ/RJ, 13ª Câmara Cível, Apelação Cível 2007.001.08548, rel.
Des. LINDOLPHO MORAIS MARINHO, j. 08/08/2007)
A 3ª Turma do
Superior Tribunal de Justiça também já decidiu da mesma forma:
“AgRg no Ag 420775 / SP
Relator Ministro ARI PARGENDLER
DIREITO CIVIL. DESPESAS CONDOMINIAIS. CRITÉRIO DE RATEIO, SEGUNDO A
FRAÇÃO IDEAL DE CADA UNIDADE AUTÔNOMA, FIXADO NA CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO.
O critério de rateio das despesas condominiais fixado na Convenção de
Condomínio somente pode ser alterado em assembléia se respeitado o quorum
mínimo previsto no artigo 25, parágrafo único, da Lei nº 4.591, de 1964. Agravo
regimental não provido.”
Por outro lado, a 1ª
Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro aplicou
interpretação diversa no julgamento da Apelação Cível nº 61.538/2007, cuja
ementa reproduzimos:
“DECLARATÓRIA. CONDOMÍNIO. CONVENÇÃO. ASSEMBLÉIA GERAL EXTRAORDINÁRIA.
ALTERAÇÃO DA CONVENÇÃO NO QUE SE REFERE APENAS AO RATEIO DAS DESPESAS
CONDOMINIAIS. QUORUM. MAIORIA SIMPLES. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO
DIREITO DE PROPRIEDADE DOS AUTORES-APELANTES. SENTENÇA CORRETA. IMPROVIMENTO DO
RECURSO.” (TJ/RJ, 1ª Câmara Cível, Apelação Cível 2007.001.61538, rel. Des.
MALDONADO DE CARVALHO, j. 11/12/2007)
Particularmente,
concordamos com o acórdão fluminense, todavia, se o texto da convenção precisa
ser mudado para que a forma de rateio de despesas seja modificada, recomendamos
que a aprovação em assembléia se dê por 2/3 dos votos de todos os condôminos.
10.
Aprovação ou alteração do
Regimento/Regulamento Interno – Art. 1.334 V do CCB – 2/3 dos votos, mas a
convenção pode fixar quorum diferente (OBS¹: Enunciado 248 da Jornada de
Direito Civil da Justiça Federal);
Sobre o Regimento
Interno, há necessidade de algumas considerações. Como mencionado, no que tange
as normas internas do condomínio, não há uniformidade entre os entendimentos da
doutrina e da jurisprudência. A grande maioria entende que Regimento Interno e
Regulamento Interno seriam a mesma coisa, e quando o Código Civil determinou
que o Regimento Interno deve fazer parte da convenção (Art. 1334, V), a maioria
sustentou que a própria convenção poderia fixar um quorum diferenciado (menos
rígido) para a alteração do Regimento, não sendo obrigatoriamente 2/3 (conforme
consta até do Enunciado 248 da Jornada de Direito Civil da Justiça Federal, que
embora não tenha força de súmula, trata-se de respeitável referência).
Concordamos com este entendimento, considerando que o Art. 1351 foi alterado
pela Lei federal ordinária n° 10.931, que, por sua vez, excluiu a alteração do
regimento interno por 2/3 dos condôminos.
Mas aí chegamos a um
impasse: os Cartórios de Registros de Imóveis somente registram Convenções
inteiro teor, e geralmente se recusam a registrar Regimentos Internos em
separado, e se o Regimento Interno não é registrável, seria ele oponível a
terceiros? E mais, se o Regimento estiver no corpo da Convenção, pode o RGI
fazer o registro sem a assinatura de 2/3 dos proprietários?
Não nos alongaremos
nesse assunto específico, temendo nos afastar do tema, contudo, a presença
dessas questões nos leva a ponderar a oponibilidade a terceiros das normas
internas de condomínio criadas por uma convenção/regimento não registrado em
cartório de imóveis. Mas, respondendo às questões do parágrafo anterior: o
registrador imobiliário está correto em recusar o registro de
Regimentos/Regulamentos em separado ou que, mesmo inclusos na convenção, não
possuam aprovação de 2/3 dos votos dos condôminos. A conduta do registrador não
está incorreta e também não gerará prejuízo aos condomínios, isso porque um
Regulamento Interno não deve conter disposições que afetem diretamente os
direitos reais dos condôminos, mas tão somente regras de conduta ou detalhes do
cotidiano da comunidade que não têm a necessidade de produzir efeitos erga omnes.
Finalizamos com um
exemplo: o direito uso concedido a um proprietário sobre laje adjacente a seu
apartamento de cobertura deve estar contido na convenção para que esta possa
ser registrada em cartório de registro de imóveis e, conseqüentemente, gerar
efeitos contra terceiros.
11.
Construção de outro pavimento ou
edifício ou novas unidades imobiliárias – Art. 1.343 do CCB – unanimidade
(OBS¹: esse é um assunto que afeta a todos, demandando recálculo das frações
ideais adquiridas; OBS²: em nossa opinião, não há como impedir um condômino,
mesmo inadimplente, de votar em matéria deste tipo);
12.
Alteração da destinação do edifício ou
da unidade – Art. 1.351 2ª parte do CCB – unanimidade (OBS¹: essa deliberação
se limita à alteração da qualificação do edifício/unidade como residencial, não
residencial ou misto, ao nosso ver, não é o quorum adequado para alteração da
finalidade de determinada área comum);
13.
Alteração de fachada – Art. 10 § 2° da
Lei n° 4.591 – unanimidade (OBS¹: embora acreditemos na revogação tácita do
referido dispositivo pelo Código Civil, consideramos temerária a aprovação de
modificação de fachada por quorum menor que o da unanimidade).
14.
Eleição do síndico e conselho fiscal –
Art. 1.347 e 1.356 do CCB, respectivamente – maioria simples em 2ª convocação
(OBS¹: o Código Civil não fixa quorum algum para esta deliberação, o que nos
remete à regra geral do Art. 1.352 e 1.353; OBS²: em nossa opinião, a convenção
não pode fixar um quorum mais rígido para essa votação, sob pena de não se
eleger nenhum síndico);
15.
Destituição do síndico em Assembléia de
transferência de poderes – Art. 1.349 c/c Art. 1.348 § 2° do CCB – maioria
absoluta (OBS¹: recomendamos a leitura de nosso trabalho “Destituição de
síndico de condomínio edilício”, JUNQUEIRA, 2007).
4.
DIREITO DE DEFESA EM ASSEMBLÉIA E PARTICIPAÇÃO DO INADIMPLENTE.
O direito fundamental
de defesa. O Art. 5°, LV da Constituição prevê a obrigação de se conceder de o
direito de ampla defesa a qualquer cidadão que for acusado em processo judicial
ou administrativo, inclusive na aplicação de penalidades à condôminos ou
ocupantes. A norma mencionada determina que: “aos litigantes, em processo
judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o
contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
Muito embora os
direitos fundamentais tenham sido inicialmente concebidos para proteger o
indivíduo do poder de império do Estado. Acreditamos ser hoje pacífico o
entendimento de que os direitos fundamentais também são oponíveis entre
particulares (a chamada eficácia horizontal dos direitos fundamentais).
Sendo assim, nos
condomínios, o presidente da AG deve permitir ao condômino ou ocupante a
apresentação de sua defesa. Para garantir que o condomínio não irá prejudicar o
direito do acusado, recomendamos que, nas deliberações que envolvem punições,
se inclua “defesa do condômino/ocupante” como item de pauta no edital de
convocação da AG, para deixar clara a oportunidade de defesa do acusado.
Ressaltamos a
necessidade de tratamento adequado na convenção do condomínio, concedendo
mecanismos aos condôminos para que possam recorrer à assembléia contra decisões
que lhes afetem. Tal providência representa um grande passo para o condomínio,
na medida em que favorece a resolução de divergências internas sem intervenção
judicial.
Também demanda
cautela a questão do condômino inadimplente não poder votar ou, sequer,
participar de assembléias de condomínio. Conforme preceitua o Código Civil:
“Art. 1.335. São direitos do condômino: (...) III - votar nas
deliberações da assembléia e delas participar,estando quite”
(grifo nosso). Não se deve confundir o condômino isento da participar no rateio
das despesas, que tem direito a voto, com o condômino inadimplente, que não tem
direito (Apelação Cível n° 2007.001.22424 julgada pela 4ª Câmara Cível do
TJ/RJ).
Diferente da antiga
lei de condomínios, o Código Civil garante sérias restrições ao condômino
inadimplente. Tendo em vista que a multa pelo não pagamento da quota de
condomínio em seu vencimento sofreu forte redução (o Art. 12 § 3º da Lei nº 4.591
permitia aplicação de multa de até 20%, mas o Art. 1.336 § 1º do Código Civil
limitou a multa para até 2%), claramente o legislador concedeu outros meios
para que o condomínio pudesse evitar e punir a inadimplência.
Além da possibilidade
fixação de juros moratórios em índice superior a 1% ao mês (Art. 1.336, § 1º) e
aplicação de multa de até cinco quotas por atrasos reiterados (Art. 1.337, caput), o Código Civil permitiu que o
inadimplente fosse proibido de participar e votar em assembléias. Não se trata
de um tratamento abusivo, mas tão somente um tratamento proporcional ao
descumprimento do dever do condômino. Afinal, se o condômino dá “as costas”
para o condomínio não pagando sua contribuição, ele abdica da sua participação
em assembléias. Lembrando que o inadimplente deve ser convocado, mas não poderá
participar ou votar.
O inadimplente terá
ciência do que foi deliberado mediante comunicação da administração ou por meio
de consulta ao livro de atas de assembléia.
É importante destacar
a hipótese de um condômino ou morador inadimplente que faz um acordo de
parcelamento de débito com o condomínio. A realização de uma acordo de
parcelamento de débito não desqualifica a condição de inadimplente do devedor,
todavia, salvo disposição em contrário na convenção ou no termo do acordo
(neste último caso, somente se a convenção for omissa), suspende todas as
penalidades aplicáveis ao inadimplemento. Sobre essa questão, selecionamos uma
decisão colegiada do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro:
“DIREITO CIVIL. CONDOMÍNIO. DIREITO DE VOTO. Ação cautelar com pedido de
liminar em que objetivam os autores exercer o direito de voto nas assembléias
condominiais, não obstante se encontrem cumprindo acordos administrativos. Fumus
boni iuris e periculum in mora presentes. Na hipótese vertente, foi publicado
Edital de Convocação para a Assembléia Geral Ordinária do Condomínio-réu, que
exigiu, como condição para participação nas eleições de síndico, não se
encontrar o condômino com qualquer pendência, inclusive acordos em andamento. Todavia, o condômino que está em dia com as obrigações
condominiais, mas cumpre acordo administrativo, o qual está sendo quitado a
medida dos vencimentos das respectivas parcelas, não pode ser tido como
inadimplente e, por via de conseqüência não pode ser impedido de votar e ser
votado em assembléias condominiais. Precedente
desta E. Corte. Verba honorária corretamente fixada, em observância aos ditames
do § 4º do artigo 20 do CPC, diante das circunstâncias do caso concreto. Pedido
procedente. Sentença mantida. Desprovimento do recurso.” (TJ/RJ, 17ª Câmara
Cível, Apelação Cível 2006.001.61830, rel. Des. MARIA INES GASPAR, j.
13/12/2006, grifo nosso).
Em outras palavras,
em nossa opinião, ao inadimplente que está cumprindo acordo extrajudicial ou
judicial de parcelamento de débitos condominial deve ser concedido direito de
participar e votar nas assembléias.
Como mencionado no
capítulo anterior, independente da existência de acordo, entendemos que os inadimplentes
não podem ser impedidos de votar em certos assuntos que afetem diretamente sua
propriedade, que classificamos como “matérias de direito de propriedade stricto sensu”.
Outra questão
importante é da harmonia entre o direito do condomínio em restringir o acesso
do inadimplente à assembléia e o direito de defesa desse mesmo condômino. Se
solicitado, o condomínio deve permitir que o inadimplente se manifeste em
assembléia em prol de sua própria defesa.
Recomendamos muita
cautela ao punir condôminos que atravessam por dificuldades financeiras, pode
ser mais razoável não aplicar algumas penalidades nesses casos. Embora não
possam ser consideradas como um abuso de direito, uma vez que não ultrapassam
os limites objetivos da lei e, portanto, não indenizáveis, tais penalidades
podem ser anuladas dependendo da análise do caso concreto pelo Juiz.
5.
CONCLUSÃO.
Por fim, estas são
apenas algumas das precauções que o condomínio deve tomar para evitar
transtornos futuros com uma anulação judicial de Assembléia. Lembrando que é de
suma importância que toda Assembléia seja realizada em um ambiente de cortesia
e respeito, uma vez que os excessos, como gritarias e xingamentos, devem ser
evitados, pois, podem ser objeto de futuros pedidos de indenização.
E, entendemos que não
se deve anular determinada cláusula convencional ou ato do condomínio (obra,
multa, etc.) se este não causar um claro desequilíbrio entre os condôminos
gerando, necessariamente, dano a alguém. Assim como, também se deve analisar se
esse “dano” realmente pode ser considerado como tal, pois, alternativamente,
pode-se causar um dano ainda maior aos demais (hipótese de alteração da forma
de rateio ou penalidades). Não se pode anular uma AG simplesmente por não
respeitar o quorum legal ou outra formalidade, porque a vida em condomínio é,
por sua natureza, flexível.
6.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
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Nacional. Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm>.
Acesso em: 25 nov. 2007.
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Nacional. Lei complementar federal n. º
95, de 26 de fevereiro de 1998. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp95.htm>.
Acesso em: 25 nov. 2007.
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Nacional. Lei ordinária federal n. º
4591, de 16 de dezembro de 1964. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4591.htm>.
Acesso em: 25 nov. 2007.
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Nacional. Lei ordinária federal n. º
10406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406compilada.htm>.
Acesso em: 25 nov. 2007.
JUNQUEIRA, André
Luiz. Destituição de síndico de
condomínio edilício. Direito Net, São Paulo - SP, 23 de outubro de
2007. Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/x/37/88/3788/>.
Acesso em: 25 nov. 2007.
BEZERRA DE MELO,
Marco Aurélio. Direito das Coisas.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.
Revista Jus
Vigilantibus, Terça-feira, 26 de fevereiro de 2008
Fonte: http://jusvi.com/
Fonte: http://jusvi.com/
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